sábado, julho 30, 2005

Procuro-me...



Procuro-me!

Procuro-me pelas florestas,
Mas lá não me encontrei
Busco-me nas finas arestas
Das lágrimas que derramei…

Procuro-me pelos mares…
Onda a onda… me aguardo,
Voando como gaivota pelos ares
À deriva em rumo salgado.

Procuro-me no som dos breves olhares…
Acerco-me da lua com distantes aromas…
Não, aqui estás… sem estares
Sim, «estás aqui» … mas entre comas.

Procuro-me… procurando-me…
Achando, que me acho
Acho que vou encontrando-me…
Em locais perdidos onde me encaixo!

Vou-me… e aqui me fico
Pertenço a este Eu, que não eu
Fico-me… e daqui me dissipo,
Para outro mundo, que não será este o meu.

Procuro-me e não me acho…
Onde estou eu?!

quinta-feira, julho 21, 2005

É Fogo, é fogo…

Em cinco sentido podemos resumir esta estranha calamidade que ano após ano, lá prossegue a sua ritual busca pelo negro!
Vislumbro… ao longe, vagas de fogo erguendo-se até ao cimo das montanha, fazendo do arvoredo uma mera escadaria de acesso ao topo de tudo que é montanha, e não cedendo, continua o forte caudal de fogo ritmado com a música que o vento em si transporta. Vemos, continuamos a ver, com um misto de incapacidade e indiferença, emaranhado pelo aperto que nos envolve o coração, vemos e continuamos a seguir o rumo deste rio de fogo.
Escuto… os estalidos suaves do fogo a devorar, com prazer, a mais pequena das faúlhas… escutamos também, a som voraz do fogo que inunda e engole de uma só vez fauna e flora… escutamos o velho passo de dança, umas vezes calmo, outras vezes mais revolto, mas... lá prossegue, o seu fado, com cores de paixão, fazendo um tango assassino com o seu par de destino... o vento. Pelo meio… há ainda o burburinho, as sirenes dos soldados da paz… dão voz ao grito de guerra para mais uma batalha… e as gentes, as gentes, materializado pelas vozes agudas femininas, fazem transparecer com gritos, gemidos e desmaios de silêncios a expressão de medo que lhes inunda a alma!
Cheiro… cheiro o calor… é possível mesmo sentir o aroma de prazer que o fogo tem… é possível rever imagens, com o simples cheiro da névoa de fumo que vai invadindo as fronteiras inatingíveis do fogo…mas também aqui ele é um vencedor, também nos locais mais distantes do epicentro, o fogo faz-se notar, pode estar muito longe de nós, mas o aroma que existe no ar, faz-nos perceber que ele, ele está bem próximo de nós, entrado em nós, camuflado no oxigénio que respiramos e livremente, circular em nós!
Estas a ver este aroma? Pois bem, cheira a olhos verdes que outrora foram tocados pelos ecos de azuis oceânicos.
Toco… e toco mesmo partes de fogo… é quente, sem que fisicamente lhe toquemos, diz-nos ao ouvido o tacto, que… aqui há fogo! Será talvez por isso que a forma do fogo, é ainda para nós algo moldável, incontrolável e indefinida… não podemos tocar-lhe… não podemos criar uma única imagem, é sempre mutável… todavia, sem que haja de facto toque… sentimos na pele a sua mensagem.
Sabor… a que saberá o fogo… qual o seu paladar… provavelmente seja de sabor a cinza… existe o travo amargo ao ver um cenário deste, existe sempre um paladar nauseado pela devassidão causada. Todavia, não será de estranhar se existir também, o doce sabor da liberdade… o doce sabor a gratidão por alguém, num determinado local e momento, criar ali mesmo uma nova família… um fogo, que se vai ramificando, uma nova arvore genealógica que busca a sucessão… uma arvore de fogo que se alimenta de outras arvores… qual canibalismos entre tribos…
Não deixa de ser curioso saber que, foi este mesmo fogo, que fez de nós – Humanos – aquilo que em grande parte hoje somos!
É fogo… é fogo… é fumo e mais fumo… ali, na floresta, as lágrimas não chegam sequer ao solo… o calor logo as transforma em gás… em nuvem de fumo… em lágrimas que lavam a própria cinza do crematório florestal. Porque não, sentir com todos os sentidos… o vale de lágrimas que inundam os nossos céus… certamente que, algo em nós vai provocar. Eu não esqueço que, há dias, passava todos os dias por uma estrada com companhias deliciosas, tinha como cenário todos os sons e sorrisos que uma floresta me poderia dar… hoje, apenas numa margem persiste o verde…a floresta! Assim como para um rio ambas as margens são fundamentais, na floresta acontece o mesmo… aquela rua que pelo meio dela passava… fazia com que as duas margem fossem o início e o fim de um só sorriso… ora, uma vez aniquilado o princípio, deixa por si só de haver fim… e se o fim, também ele desaparecer, deixa de fazer sentido… o princípio do fim continuar a viver! (Inicio - Os sorrisos não existem pela metade - Fim)

quinta-feira, julho 07, 2005

Ruas Com Sentidos…


Cidade…correria… pessoas seguindo seu rumo, procurando algum destino que nem elas próprias têm presente… seguem rumos e roteiros por ruas conhecidas e mais que revisitadas… onde um curioso pormenor de uma varanda nos passa despercebido, o sempre um painel de azulejos que ficou invisível à nossa passagem, há sempre uma pomba citadina buscando o seu alimento diário a intrometer-se nas vias rápidas dos arruamentos pedonais… há sempre um papel, um plástico que ao sabor do vento baila e nos contorna, como tentando acordar do nosso sono acordado… mas não, prosseguimos nossa direcção, imparáveis... adormecidos no ambiente… respirando os fumos negros sem que uma haja uma qualquer desobediência corporal…e caminhamos… e caminhamos... uns cabisbaixo de olhar preso no chão… talvez não querendo olhar de frente aquele mesmo cenário diário… procurando no chão, não a fuga dos sentimentos mais… uma almofada de paixão… talvez seja nesse mesmo granito… que o grito humano seja verdadeiramente escutado… outros há que prosseguem de olhar levantado… olhando em frente e respondendo aos caprichos hormonais… mudando de trajectória visual apenas quando uma corrente mais forte nos passa e nos cativa… prendendo até ao limite máximo dos olhos… ate onde o pescoço possa suportar…ate onde o social possa não condenar…
Embora posturas diferentes… algo comum circula… os pensamentos perdidos… que vão atracando nos mais diversos chamamentos… prosseguem independentes da nossa vida mais real… os momentos de pausa entre obrigações e responsabilidades… são vividos de forma independentes… alias, deve ser por isso…quando duas pessoas têm a mesma rota… esboçam quase sempre um sorriso, é quase impossível controlar e evitar… imensas vezes sentimos que alguém esta em rota de colisão com o nosso trajecto… e então, um passo mais para a direita, um passo mais para a esquerda…uma ligeira pausa ou redução do passo… subtilmente tentamos que o encontro não aconteça… mas, quantas vezes é inevitável…quantas vezes há aquele desviar para o mesmo local…como que fugindo de encontro um ao outro… e ai…ai sim... há aquele sorriso… o pedido de desculpas envergonhado… mas logo o sorriso se esquiva e retomamos novamente nosso rumo e nosso semblante! Mas… porquê? Porque nossos rumos vão de encontro com estranhos… será que os pensamentos…a nossa outra personalidade que caminha ao nosso lado, foi mais forte e nos levou de encontro a alguém cujos pensamentos coincidiam… não será esse mesmo sorriso uma forma tribal inter-pensamento para se saudar… não será o sorriso… um suspiro… uma única forma de contacto entre pensamentos… pensamentos que nunca se encontram… mas que apenas se avistam à luz do sorriso…
Enfim… muitas duvidas… algumas fantasias… fundamentadas pela realidade dos sonhos de cada um… mas… o que realmente passa nos corredores de corpos humanos nas nossas cidades… isso… acho que muito dificilmente se compreenderá!
Estão a ver a rua? Está… repleta de … sentidos e emoções… as pessoas essas… não as vejo… estão ausentes… vejo-as à minha frente…ausentes!
Tudo isto aconteceu porque… tive uma espera não prevista… a loja do centro da cidade abria apenas as 14:30 e não as 14:00 como erradamente pensei… e por isso divaguei!
E uma vez mais, surge na minha mente, um dos meus conceitos mais misteriosos… tempo atempadamente incerto, que nos desvias (guias) pelos errados caminhos do correcto!